The Summer Portraits: como Einaudi pinta o verão com melancolia

Quando Ludovico Einaudi lança um novo álbum, sabemos que não estamos apenas perante um conjunto de peças musicais, mas diante de uma experiência emocional. Com The Summer Portraits (2025), o compositor italiano regressa com um ciclo de 13 peças que são, mais do que nunca, retratos sonoros: evocações da luz, da liberdade e da nostalgia que o verão nos deixa.

A villa, os quadros, a memória

O álbum nasceu da estadia de Einaudi numa villa numa ilha mediterrânica, onde passou o verão anterior. Ao chegar, descobriu que a casa estava decorada com 30 a 40 quadros a óleo — todos aparentemente da mesma autora. Após alguma investigação, ficou a saber que a casa pertencera a uma mulher que ali veraneava todos os anos com a família e que deixava, a cada verão, novas pinturas como testemunho desse tempo.

Inspirado por esse gesto silencioso e criativo, Einaudi mergulhou nas suas próprias memórias de verão: “o tempo em que a vida estava ligada aos sentidos, em que os dias pareciam meses, os meses como anos, e eu era livre do amanhecer ao anoitecer… a natureza era parte de nós, nós éramos natureza”. Foi esse sentimento que o levou a criar os seus próprios retratos — mas com música. “Este álbum é dedicado a todas as nossas memórias dos verões intermináveis, a todos os momentos belos que vivemos”, explicou.

Entre a leveza e a profundidade

Em The Summer Portraits, Einaudi continua fiel à sua identidade: piano minimalista, melodias circulares, uso delicado da repetição. Mas desta vez junta a isso os arranjos orquestrais gravados com a Royal Philharmonic Orchestra, elevando a textura emocional das composições. A leveza do piano encontra contraponto nas cordas, que sugerem a densidade da memória.

O tempo como paisagem

Tal como em discos anteriores, o tempo é o grande tema. Aqui, o verão é mais do que uma estação: é uma ideia. Uma lembrança do que foi vivido, do que poderia ter sido, ou do que já não volta. Em faixas como “In Memory of a Dream” ou “Santiago”, somos convidados a percorrer caminhos interiores. Não são paisagens que se vêm, são paisagens que se sentem.

Cinematografia sonora

Não é de admirar que a música de Einaudi continue a ser escolhida por realizadores e publicitários. Neste álbum, cada tema soa a uma curta-metragem emocional. “Rose Bay” poderia ser a abertura de um filme sobre reencontros. “Maria Callas”, com o seu dramatismo contido, seria perfeita para uma sequência de memórias apagadas.

Um verão amadurecido

Aos 69 anos, Einaudi olha para o verão não com a impetuosidade da juventude, mas com a serenidade de quem sabe que os dias longos também acabam. É um disco que não celebra a estação, mas a saudade que ela deixa. E talvez por isso nos toque tanto.

The Summer Portraits é, mais do que um disco, um espelho de sensações. Uma memória musical do verão que, como todas as boas lembranças, sabe misturar luz e sombra com uma elegância silenciosa.

Um convite à escuta

Convido-lhe a escutar The Summer Portraits com tempo e silêncio — talvez ao fim da tarde, com uma luz morna a entrar pela janela. Deixe que cada faixa lhe leve de volta aos seus próprios verões: aqueles que viveu, sonhou ou perdeu. Pode começar por “Rose Bay”, “In Memory of a Dream” e “Santiago” — e deixar que o resto lhe encontre.

Disponível nas principais plataformas de streaming, ouça-o como quem folheia um velho álbum de fotografias. Mas aqui, as imagens são som.

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Respostas de 2 a “The Summer Portraits: como Einaudi pinta o verão com melancolia”

  1. Avatar de Manuel Costa
    Manuel Costa

    Obrigado por escreveres sobre o meu compositor favorito de todos os tempos. Obrigado pela tua sensibilidade. Cada álbum dele, cada música dele, são viagens mentais. Este álbum específico, leva-me a uma praia sem fim, onde agarro areia debaixo do sol e observo o horizonte de um oceano vazio e encantador.
    Ludovico Einaudi, através das teclas do piano, tira-nos momentaneamente deste nosso mundo desfigurado.

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    1. Avatar de jpaulostrindade

      Ainda bem que gostaste. Se gostas de Einaudi, espreita Yiruma e Nils Frahm

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